MINHAS IMPRESSÕES SOBRE O MANGÁ DO JASPION.
Eu
estava muito ansioso para finalmente chegar o dia do lançamento do mangá do Fantástico
Jaspion, o herói japonês que
marcou minha infância, com a retomada do interesse novamente por nós
brasileiros depois que ele teve sua exibição pela Band no período da Pandemia
da COVID-19. Não via a hora de
finalmente poder comprar um material impresso desse herói que há décadas não
era produzido. E finalmente consegui, graças a compra virtual pelo site da
Amazon como meu presente de Natal e chegou bem antes da na segunda-feira, 21 de
Dezembro de 2020. Eu lembro muito
vagamente de quando eu era criança que meu pai comprou para mim numa banca de
jornal, isso lá pelo final dos anos 1980 e começo dos anos 1990, de uma revista
em quadrinhos do Jaspion junto com o Esquadrão Relâmpago Changeman publicado
pela EBAL, que se não me falhe a memória era
todo colorido com traços bem cartunescos dos personagens, numa edição
em estilo formatinho, seguindo o padrão
das publicações mensais de Turma da Mônica
então ainda na Editora Globo, atualmente se encontra na Panini e dos gibis da
Marvel e DC quando eram publicados pela Abril, hoje encontram-se também na
Panini.
Minha
grande expectativa já que o mangá em questão
O Regresso do Jaspion, este é fruto de uma produção
original brasileira pela editora JBC, mostrando a ação do heróis retornando a
Terra 30 anos após destruir Satan Goss e vem retornando aqui para impedir que
ele seja ressuscitado pela Bruxa Galáctica Kilmaza para trazer o reinado
infernal da mais pura maldade numa Terra muito diferente da que ele tinha
conhecido antes, ou seja, os eventos posteriores ao seriado.
Minha
relação com Jaspion é algo difícil de explicar, do mesmo jeito como é difícil
explicar o porquê de nós brasileiros temos uma forte sintonia, identificação ou
mesmo ligação com ele. Que simboliza
a cultura de outro pais, localizado do
outro lado do oceano que é o Japão. Uma das coisas que posso deduzir de maneira
muito superficial pode estar no fato de que o herói como muitos na cultura pop,
carrega uma característica que remete a fórmula campbeliana da Jornada do
Herói, que é aonde norteia vários segmentos de histórias.
A
fórmula da Jornada do Herói desenvolvido pelo estudioso e mitólogista americano Joseph Campbell(1904-1987) se baseia
na divisão de três atos, onde o primeiro ato começa do herói saindo do seu Mundo Comum e inicia sua jornada do Chamado à Aventura e finalizando com a
Travessia do Primeiro Limiar. Já o segundo ato tem início com o Ventre da
Baleia e vai até a recompensa e chega ao terceiro ato com o caminho de volta e
o retorno do elixir e volta para o mundo comum.
Jaspion
segue bem essa fórmula, quando a gente
lembra que ele começa vivendo no Planeta de Edin que o alerta sobre o perigo de
Satan Goss, e ele começa sua jornada solitária vagando pelo espaço de planeta
em planeta onde o Satan Goss quer destruir e criar o seu Império dos Monstros. Até
resolver definir pelo Planeta Terra. E aqui ao longo de todo o seu percurso vai
se deparar com novos perigos, mais desafiadores e encontrar novas alianças.
Uma
dessas características que a jornada do herói defini é o fato dele sempre
carregar o arquétipo do órfão. Uma coisa que em todos os heróis famosos da
cultura pop tem dessa característica, desde os populares super-heróis dos quadrinhos da DC como o
Batmam, Superman, Aquaman, ou mesmo da Marvel como o Homem-Aranha, Homem de
Ferro. Também nas animações Disney como
o Alladdin, Rei Leão, Tarzan, nos animes como o Goku de Dragon Ball, Seyia, Shiryu, Hyoga,
Shun e Ikki em Cavaleiro do Zodíaco, O Ogro Shrek, Luke Skywalker na franquia
clássica de Star Wars, Frodo no Senhor dos Anéis e o
bruxinho Harry Potter da saga literária da britânica J.K.Rowling.
Isso
ocorre, porque de todos heróis terem esta característica como órfãos a
representação dá uma maior carga dramática motivacional para que o público
possa se comover com suas dores, e ele
possa conquistar sua vitória, ainda que ok, o fato deles serem representados como
órfãos não romantiza o drama deles crescerem sem uma boa base familiar e viverem
propícios a seguirem pelo mau caminho, muito
ao contrário da afirmação da famosa frase do filosofo suíço-francês
Jean-Jacques Rosseau(1712-1778) de que “O ser humano é bom por natureza, a
sociedade o corrompe”, ainda assim a
carga dramática motivacional gera mais empatia por eles.
E
Jaspion vai bem por este segmento, cresceu sem conhecer os pais que morreram
quando era ainda bebê e foi adotado e criado
por um velho sábio profeta Edin.
Que investigava uma profecia da Bíblia Galáctica. Que comentava do grande mal
no universo. Representado por um gigante
ser demoníaco, trajado de uma armadura preta metálica inspirada em Darth Vader que
dava um tom bem sombrio, fruto das
energias negativas do Universo chamado de Satan Goss.
Outro
fator
e este acredito eu que seja o mais óbvio para explicar o porquê do herói
ser tão querido por nós brasileiros, mais do que os japoneses, seja o fato da série apresentar muitas
referências ligadas ao cristianismo. Visto que maior parte da população brasileira é católica. Um
contraste em relação com a população
japonesa cujos praticantes do catolicismo são
menor, maior parte deles são xintoístas. Isto pode ser sentido pelo
próprio Jaspion simbolizar bastante o arquétipo do salvador vindo do céu,
destinado a proteger a Terra do mal e ao qual ele foi destinado pelo Senhor
Todo Poderoso.
A
figura messiânica do profeta Edin também carrega esta simbologia cristã
ocidental. Do mesmo modo quando ele fala da profecia da Bíblia Galáctica, se referindo ao Velho e o
Novo Testamento Cristão. O Pássaro Dourado que em alguns episódios da série agiu como o Deux Ex-Machina do Jaspion
ser despertado pelas cinco crianças irradiadas pela luz de Nosso Senhor e Jaspion ser o escolhido para acabar com
o Satan Goss e seu exército de asseclas
comandado pelo seu filho MacGaren também tem essa referência cristã ao capiroto
e seu exército da religião cristã ocidental e ao Apocalipse.
Podemos
bem observar como Jaspion ao travar uma
batalha entre o bem e o mal, sendo representado por ser demoníaco gigante, que ali temos muito carregado de uma referência bíblica a história do Rei Davi equivalente a Jaspion
enfrentando o Gigante Golias equivalente a Satan Goss.
Do
mesmo jeito que a trama trabalhou bem as camadas de evolução do personagem. Que
na primeira metade da série agia muito abobalhado e imaturo, sendo até
grosseiro com a androide ginoide Anri. A
partir da segunda metade, passa a ter um perfil mais sério e mais focado na sua
missão. Na sua jornada de defender a Terra de ser dominada pelo império
demoníaco de Satan Goss para criar aqui o seu
Império dos Monstros.
Avaliando
tecnicamente com um outro olhar após dar uma revisitada na série ao passar nas manhãs de domingo na Band durante
o ano de 2020, eu antes já tinha
revisitado a série quando adquiri há uns dez uns lotes de DVDs da série
lançados pela Focus Filmes em 2009. O Fantástico Jaspion ( Kyoujuu
Tokusou Juspion, Japão, 1985-1986) pode não ser considerado um grande exemplo de obra-prima televisiva com roteiro magnífico e bem escrito, chegando
ao patamar de figurar como uma grande obra de arte primorosa e reflexiva, apresentando
até alguns furos de roteiro, como o fato
de Jaspion sendo detetive dá umas mancadas de não perceber pequenas pontas soltas
ou mesmo outras inverossimilhanças na série como ele demorar a perceber que
Kanoko e Kenta eram órfãos de mãe quando Nambara os encarregou de cuidar deles
enquanto ia investigar o Pássaro Dourado, ou mesmo Jaspion ser apresentado a Nambara
como professor, sendo que ele era fotógrafo e em nenhum momento da série é
mostrado ele sequer lecionando numa sala de aula ou mesmo Satan Goss começar
depois de Kilza aparecer dentre outros.
Visto ter sido concebido na época, década de 1980, período que o Japão ainda
vivia na Era Showa com o intuito unicamente de vender brinquedos.
Aos
olhos de hoje pode parecer muito esquisito ver umas produções dessas capengas, toscas, sem
sofisticação, com uns efeitos especais
práticos um tanto quanto rudimentares, primários e já bastante datados. Que num
grau de comparação com as atuais séries de tokusatsu, principalmente as da
franquia super sentai adaptada para Power Rangers, as produções tem se mostrado
mais caprichadas nos efeitos especiais. Principalmente pela concepção bastante
extravagante dos monstros de borrachas, que mesmo parecendo horrorosas, pelo
menos criava uma movimentação bem convincente e orgânica e bastante medonha, me
dava medo ver os gigantes monstros de borracha, juntando aos
figurinos muito bregas dos vilões, com um nível de puro mau gosto kitsch. Ainda
mais nos decotes bem provocantemente sensuais das vilãs. O que pode ser
explicado pelo tipo de estética caracteristicamente japonês inspirado no
conceito artístico do tradicional teatro kabuki.
Onde
crianças como eu e hoje adultos ainda o
glorificam, o mitificam, o santificam. De certo modo, ok, Jaspion pode estar
longe de ser considerado o melhor exemplo de grande produção primorosa, mas
pelo menos carregava um mote de história ainda que batido, mas que era muito fascinante e empolgante de acompanhar e com ótimas mensagens atemporais, como na
situação que ocorreu no episódio 09, A História de uma Árvore,
onde a Árvore de Cedro que Satan Goss transformou em monstro solta um pólen que
faz a população de Tóquio inteira espirrar e todos andam pelas ruas com a máscara
de proteção. O que tem ocorrido bastante frequente nesse momento em que o
perigo do vírus da COVID-19 pelo mundo todo, algo que já era uma realidade
muito comum aos japoneses em situações desse tipo. Principalmente se a gente
for lembrar de outros históricos casos de vírus que atingiram muitos países do
continente asiático que ficam próximos ao Japão, como a Gripe Aviária, a Gripe
Suina por exemplo.
Já
concluída minha leitura no caprichado
trabalho do mangá de capa dura produzido
pela JBC, que contaram com roteiro original do Fábio Yabu e com desenhos do
Michel Borges com aprovação da Toei Company e da Sato Company. E posso garantir é excelente história, que
respeita muito o universo e a essência
mitológica do herói. Onde os diálogos mantiveram algumas coisas como os
nomes dos golpes alterados pela dublagem clássica dos anos 1980 produzida pelo
extinto paulista da Álamo. Fora o
material extra que trouxe algumas ates conceituais para o mangá, e os
depoimentos de algumas pessoas que tiveram sua história envolvida com Jaspion. Como
o ator Hiroshi Watari que representou o
Boomerman na série, a atriz Kyomi Tsukada que fez a Anri, o cantor Akira
Kushida que cantou o tema do Daileon na série. Carlos Takeshi que fez a voz do
Jaspion dentre outros que tiveram sua história envolvida com ele como Toshihiko
Egashira que trouxe Jaspion para o Brasil na década de 1980, por exemplo.
Um
roteiro incrível, bem fechadinho, com uma ótima qualidade de traço que em
alguns momentos aparece bastante horrendo e pode provocar sustos, mas é
fantástico de todo modo. Num mote em que
quando Jaspion retorna a Terra sabendo da volta a ameaça de Satan Goss ele terá
como grandes aliados Boomerman, John Tiger, Nambara e Aigaman. Com algumas
referências e easter eggs bem interessantes e trazendo uma abordagem
interessante com algumas atualizações com a humanidade refletindo o atual
momento do sentimento polarizado de ódio dentre outros.
Confesso
que ao ler e reler o mangá, tanto as cenas épicas de batalhas quanto os
diálogos mexeram muito com minha memória auditiva ao imaginar nestes momentos
sendo tocadas as músicas incidentais compostas por Chumei Watanabe, a
reprodução da abertura da série com a música cantada pelo saudoso Ai
Takano(1951-2006).
A
cena do Daileon cantada por Akira Kushida, ou mesmo, os diálogos dos
personagens com as vozes do casting de
dubladores da década de 1980, como o Jaspion sendo dublado pelo Carlos Takeshi,
que na série foi representado pelo Seik Kurosaki, que as vezes assinava como
Hikaru Kurosaki. Takeshi que atualmente não trabalha mais em dublagem, há muito
tempo vem se dedicando mais aos trabalhos em TV, como novelas e durante muito
tempo apresentou o canal de Televendas Shoptime. Do mesmo que fiquei imaginando
na minha cabeça ao ler o mangá os diálogos da Anri sendo dublada ou pela Denise
Simonetto que dublou a personagem do episódio 01 ao 16 e que a partir do 17 em
diante foi dublada pela Cecilia Lemes que na série foi representada pela Kyomi
Tsukada. Esta segunda que ainda permanece
no ramo da dublagem, enquanto que a primeira pelo que suponho deve ter se
aposentado?
Do
mesmo jeito foi em relação a imaginar os diálogos do Boomerman, representado na
série pelo Hiroshi Watari, no mangá na voz do saudoso Carlos Laranjeira(1956-1993).
O MaCGaren representado na série por Junich Haruta, na voz do também saudoso Ricardo Medrado cujo paradeiro pelo
que era informado nos tempos dos fóruns das antigas comunidades de dublagem do
Orkut era desconhecido até se confirmar que ele havia falecido em 2002, que fez
a segunda voz do personagem a partir do episódio 17 em diante que quando ele
aparece no 04 ao 16 era dublado pelo saudoso Francisco Borges(1934-2008) que se
alternava com narrador ao lado do Benjamin Filho, cujo paradeiro atual é
desconhecido. Assim como fiquei imaginando o saudoso Líbero Miguel(1932-1989)
fazendo a voz do Ikki representado na série por Toshimischi Takahashi e dos Satan Goss nos diálogos do mangá. O
Professor Nambara no mangá sendo falando
pelo Armando Tiraboschi que na série foi representado pelo célebre cantor de
abertura de tokusatsu Isao Sasaki, este que que do castin de vozes da série
dublada nos 1980 pela Álamo que ainda continua ativo, o Aigaman sendo falando pelo Gilberto Barolli
como na série, este que também continua ativo no ramo como a Cecilia Lemes e o
Armando Tiraboschi. A Kilmaza sendo dublada pela Neuza Maria Faro como na série,
e duas dubladoras que partiram em 2020, que no caso foram Neuza Azevedo que dublou a Purima na série,
que foi representada por Misa Nirei, já
se encontrava afastada da dublagem desde 2010 por causa do Alzheimer e Nair Silva que fazia Goryu na
série representada por Misa Nirei que foi uma das vítimas dessa desgraça da COVID-19
e por fim também fiquei imaginando a voz do saudoso Borges de Barros(1920-2007)
que fez a voz do Edin na série que foi representado pelo também saudoso Noburo
Nakaya(1929-2006), dublando o personagem que aparece rapidamente no mangá numa
cena onde Jaspion se encontra entre a vida e a morte.
Por
essas e outras sua leitura vale a pena.